À Álvares de Azevedo

domingo, 23 de setembro de 2012




Como acabei de ler Lira dos Vinte Anos, de Álvares de Azevedo, resolvi postar minha poesia preferida do livro e homenagear este grande autor, que morreu jovem, mas deixou uma linda obra!


O POETA

Era uma noite: - eu dormia...
E nos meus sonhos revia
As ilusões que sonhei!
E no meu lado senti...
Meu Deus! por que não morri?
Por que no sono acordei?

No meu leito adormecida,
Palpitante e abatida,
A amante de meu amor,
Os cabelos recendendo
Nas minhas faces correndo,
Como o luar numa flor!

Senti-lhe o colo cheiroso
Arquejando sequioso
E nos lábios, que entreabria
Lânguida respiração,
Um sonho do coração
Que suspirando morria!

Não era um sonho mentido:
Meu coração iludido
O sentiu e não sonhou...
E sentiu que se perdia
Numa dor que não sabia...
Nem ao menos a beijou!

Soluçou o peito ardente,
Sentiu que a alma demente
Lhe desmaiava a tremer,
Embriagou-se de enleio,
No sono daquele seio
Pensou que ele ia morrer!

Que divino pensamento,
Que vida num só momento
Dentro do peito sentiu...
Não sei!... Dorme no passado
Meu pobre sonho doirado...
Esperança que mentiu...

Sabem as noites do céu
E as luas brancas sem véu
Os prantos que derramei!
Contem do vale as florinhas
Esse amor das noite minhas!
Elas sim... que eu não direi!

E se eu tremendo, senhora,
Viesse pálido agora
Lembrar-vos o sonho meu,
Com a fronte descorada
E com a voz sufocada
Dizer-vos baixo: - Sou eu!

Sou eu! que não esqueci
A noite que não dormi,
Que não foi uma ilusão!
Sou eu que sinto morrer
A esperança de viver...
Que o sinto no coração!

Riríeis das esperanças,
Das minhas loucas lembranças,
Que me desmaiam assim?
Ou então, de noite, a medo
Choraríeis em segredo
Uma lágrima por mim!
Dorme, meu coração! Em paz esquece
Tudo, tudo que amaste neste mundo!
Sonho falaz de tímida esperança
Não interrompa teu dormir profundo!
Tradução do Dr. Octaviano

Fui um douto em sonhar tantos amores...
Que loucura, meu Deus!
Em expandir-lhe aos pés, pobre insensato,
Todos os sonhos meus!

E ela, triste mulher, ela tão bela,
Dos seus anos na flor,
Por que havia de sagrar pelos meus sonhos
Um suspiro de amor?

Um beijo - um beijo só! eu não pedia
Senão um beijo seu
E nas horas do amor e do silêncio
Juntá-la ao peito meu!
_____

Foi mais uma ilusão! de minha fronte
Rosa que desbotou
Uma estrela de vida e de futuro
Que riu... e desmaiou!

Meu triste coração, é tempo, dorme,
Dorme no peito meu!
Do último sonho despertei e n'alma
Tudo! tudo morreu!

Meus Deus! por que sonhei e assim por ela
Perdi a noite ardente...
Se devia acordar dessa esperança,
E o sonho era demente?...

Eu nada lhe pedi: ousei apenas
Junto dela, à noitinha,
Nos meus delírios apertar tremendo
A sua mão na minha!

Adeus, pobre mulher! no meu silêncio
Sinto que morrerei...
Se rias desse amor que te votava,
Deus sabe se te amei!

Se te amei! se minha alma só queria
Pela tua viver,
No silêncio do amor e da ventura
Nos teus lábios morrer!

Mas vota ao menos no lembrar saudoso
Um ai ao sonhador...
Deus sabe se te amei!... Não te maldigo,
Maldigo o meu amor!...

Mas não... inda uma vez... Não posso ainda
Dizer o eterno adeus
E a sangue frio renegar dos sonhos
E blasfemar de Deus!

Oh! Fala-me de amor!... - eu quero crer-te
Um momento sequer...
E esperar na ventura e nos amores,
Num olhar de mulher!
Só um olhar por compaixão te peço,
Um olhar mas bem lânguido, bem terno...
Quero um olhar que me arrebate o siso,
Me queime o sangue, m'escureça os olhos,
Me torne delirante! 


(Álvares de Azevedo)



3 comentários:

  1. Nossa, como eu gosto do Álvares. :) lindo, lindo!

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  2. ah, quase esqueci. sou nova seguidora. se quiser retornar o favor:

    http://www.blogger.com/follow-blog.g?blogID=1309647502936152953

    http://notjustnonsense.blogspot.com/

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  3. Linda poesia.. gosto deste poeta!

    Beijos.

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