"Eu te amo"

sábado, 29 de dezembro de 2012



Está escrito nos seus olhos
Está escrito nos meus
Está escrito nas paredes que criou
Nas que criei
Está escrito na curva dos seus lábios
Nas palavras que nunca dirá
Está escrito em seus pensamentos
Aqueles que você nega
Está escrito na ponta dos seus dedos
Está escrito no seu vulto no espelho
Está escrito na sua dor
No seu louvor
    
Está escrito em nosso silêncio
Está escrito na pétala que cai
Está escrito até nos espinhos
Que você traz
Está escrito nas calçadas em que passa
Está escrito na mesa em que trabalha
Está escrito em seu sangue
Na minha alma
Está escrito, mas ninguém percebe
Está escrito, mas ninguém releva
Só eu e você
Está sempre em nós.

(Elaine Rocha)

Hoje é o fim do mundo

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012


Hoje é o fim do mundo
Todos foram convidados
Em alguns minutos, ele estará acabado
O que você fará, sorrirá com seus amigos?
Ou chorará um pouco, em torno dos seus pecados?
Mas não tema, não tema
É só o final da humanidade
Por que tanto sofrimento
Por essa calamidade?
Não esqueçamos que a vida
Anda ao lado da morte
Se viveu até hoje, agradeça sua sorte
Caminhe, caminhe
A nossa hora chegou
Abrace os familiares, perdoe os inimigos
Declare um grande amor
Segure as mãos de alguém, feche bem os olhos
Tente se consolar e finja que não tem culpa
Antes que perceba virá a escuridão
Destruindo o solo verde
Interrompendo uma oração
 
(Elaine Rocha) 



Uma música para curtir enquanto o fim do mundo não chega:


Mundo de Palavras

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012




O meu mundo é de palavras
palavras escritas, palavras faladas
palavras lidas, eternizadas
palavras que formam a beleza
palavras que trazem tristeza
palavras que nem existem
palavras que esperam fluir
na mente, nos dedos, no lápis
ou que vibram nos lábios
palavras que não foram ditas
palavras desperdiçadas
palavras que alentam
e também as que atormentam

palavras que iluminam, escurecem
palavras que perdoam e apetecem
palavras suaves e rudes
palavras inocentes, sem virtudes
palavras curtas, reticentes
palavras nulas, independentes
palavras que compõem uma fé
 palavras que a destroem
palavras falsas, verdadeiras
palavras sérias, arteiras 
palavras sem significado
palavras vivas, essenciais
que movimentam-se, itinerantes
palavras, só palavras
infinitas, inconstantes

(Elaine Rocha)

Ensaio sobre a cegueira - José Saramago

domingo, 16 de dezembro de 2012


Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara.

(Livro dos Conselhos)


Se encontrava mergulhado numa brancura tão luminosa, tão total, que devorava, mais que absorvia, não só as cores, mas as próprias coisas e seres, tornando-os, por essa maneira, duplamente invisíveis.

(pág. 16)


Se não formos capazes de viver inteiramente como pessoas, ao menos façamos tudo para não viver inteiramente como animais.

(pág. 119)


Levei a minha vida a olhar para dentro dos olhos das pessoas, é o único lugar do corpo onde talvez ainda exista uma alma.

(pág.  135)


Quem vai morrer, já está morto e não o sabe (...) Por isso, de uma certa maneira, é como se já tivéssemos nascido mortos.

(pág. 196-197)


Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que nós somos.

(pág. 262)


Mais necessidade teriam os que estão vivos de ressurgir a si mesmos, e não o fazem.


Já estamos meio mortos, disse o médico, Ainda estamos meio vivos, respondeu a mulher.

(pág. 288)


O silêncio ainda é o melhor aplauso.

(pág. 292)

Do lamento à cura

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Dramatis Personae


CAECUS: Ex-general romano

ATELLA: Mulher de Caecus

CAMILLUS: Filho de Caecus

FEITICEIRA

CRASSUS: Conselheiro

Alguns criados



CENA: A ação se passa em Roma.



ATO I



CENA I



Roma. Jardins da casa de Caecus.

(Entram Caecus e Camillus, este guia seu pai.)



CAECUS:

                Meu filho, ajude teu velho pai. Ilustra-me este nascer do dia.

CAMILLUS:

                    Hoje o sol está magnífico, meu nobre pai. O dourado leitoso arde os olhos. Sentes na face o brilho?

CAECUS:

               Sim...

              Ah! Como o destino é torpe! Maldigo minha sorte! Queria ver novamente as cores, daria por isto qualquer coisa.

CAMILLUS:

                   Não se aflija, meu pai.



(Entra Atella.)



ATELLA:

              Camillus, vais tomar o desjejum. Deixe-me conversar com teu pai.



(Camillus sai.)



ATELLA (segurando a mão do marido):

                                                                    Meu nobre esposo, em breve nosso filho completará anos.  Almejo fazer uma comemoração. Tenho a tua permissão?

CAECUS:

               Claro! Ele merece, De mim sempre se compadece. Ajuda-me e guia-me desde que perdi a vista.

ATELLA:

              Bom! Organizarei tudo. Será um banquete inesquecível!



(Entra um criado.)



CRIADO:

              Perdoe a intromissão, nobre senhor.  A feiticeira chegou e espera na sala de reunião.

CAECUS:

               Diga que já vou.



(O criado sai.)



ATELLA:

             Meu marido, que feiticeira? Não desististe desta ideia?

CAECUS:

               Escuta-me Atella, esta é diferente. Dizem que já curou o próprio Augusto!

ATELLA:

              Enlouqueceste! Até onde tua obsessão te levará? Ninguém poderá devolver-lhe a visão. Há quanto tempo procuras? Chamaste curandeiros e bruxas, de todo lugar do mundo. E o que eles revelaram? Nada, absolutamente nada!

CAECUS:

               Chega! Por que me atormentas? Ainda não perdi a fé! Serei curado, e tu verás, mulher!



(Sai.)



ATELLA (à parte):

                               Se continuar assim, perderá a razão. Que os deuses nos protejam!



(Sai.)





CENA II



  Salão de reunião.

(Entram Caecus, Crassus, a Feiticeira e alguns criados.)



CRASSUS:

                 Aqui está ela, nobre senhor. Trouxemo-la do porto. Ela já ia partir.

CAECUS:

               Então, é verdade? Restabeleceste o Imperador?

FEITICEIRA:

                    Sim, nobre romano. Retirei-lhe uma doença que o afligia.

CAECUS:

               Achas que me curarás?

FEITICEIRA:

                    Certamente.

CAECUS:

               Se curar-me, dar-lhe-ei muito ouro.

FEITICEIRA:

                    Não quero teu ouro. Só conte-me: como perdeste a visão?

CAECUS:

               Ah! Gentil senhora! Foi há quatro anos. Eu era um general, defendia o nobre Antônio e a honra do finado César. Nas planícies de Philippi, matei vários inimigos. E quando, vitorioso, afastava-me a cavalo deste descampado, um traiçoeiro cavaleiro acertou-me uma flecha. Tombei no chão, e bati numa pedra. Eu não morri, mas a visão perdi.

FEITICEIRA:

                    Cruel destino! Permita-me então, farei seus olhos enxergarem.

CAECUS:

               É só o que lhe peço, senhora.

FEITICEIRA:

                    Porém aviso... Em tudo há consequências. Ao voltares a ver, talvez outra coisa venhas a sofrer.

CAECUS:

               Oh! Não me importo! Minha visão, é só o que desejo! Anos na escuridão... Não suporto mais! Quero rever minha família, tornar a ser um general destemido. Sim, sim, não me importo. Faça-me enxergar!



(A feiticeira aproxima-se e põe as mãos nos olhos de Caecus. Murmura algumas palavras.)



FEITICEIRA:

                    Pronto!

CAECUS (em êxtase):

                                     Esta claridade me queima... Oh! Eu vejo, vejo! Crassus... Estás aí! Não mudaste em nada! As cadeiras, a mesa... Eu vejo! Abençoada seja, senhora. Conseguiste!



(Entra Atella, com Camillus.)



ATELLA:

                Meu marido, aconteceu uma tragédia! De uma hora para outra, nosso filho ficou cego!

CAECUS (abraçando o filho):

                                                 Ah, meu filho, pegaste minha maldição? Perdoa-me... Perdoa-me! Não queria... Perdoa-me!

CAMILLUS:

                   Meu pai...

ATELLA:

             Tu enxergas? Que fizeste? Cegaste Camillus! Eu disse-lhe para parar, deixar em paz teu infortúnio! Vês agora? Por causa disto teu filho está cego!

CAECUS (ajoelha-se):

                                     Perdoem-me, perdoem-me...

                                     (à feiticeira):

                                     Maldita! O que ocorreu...

FEITICEIRA:

                    A tua própria obsessão levou a isto. Não me culpe por tuas escolhas. Obtiveste o que sempre desejaste! Tens de volta tua visão. Mas avisei que haveria alguma consequência. A partir de agora, será cega toda a tua descendência.



(Saem.)


Elaine Rocha

O Conselho dos homens velhos

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

– Atenção… atenção! Senhores, por favor!

O burburinho gerado pelos velhos parou um instante. Na mesa, um silêncio ansioso instalou-se. O curador, murmurando um obrigado, continuou a falar:

–  Senhores, sabemos o motivo desta urgente reunião. Portanto, vamos direto ao ponto. O Sete, que Deus o tenha, não nomeou ninguém antes de morrer. Nem mesmo uma indicação. Então, segundo nosso estatuto, deve-se fazer uma votação para eleger o novo presidente.

Todos no Conselho já esperavam isso. Dezoito cadeiras rangeram ligeiramente, as pessoas estavam nervosas. Não conseguiram absorver plenamente o que o curador dissera, pois alguém levantou-se, atrapalhando seus raciocínios enferrujados.

– Uma votação é longa demais. – Nove falou, voz e mãos trêmulas. Tinha mal de Alzheimer e várias outras dores corporais que curvavam suas costas.

Outras vozes juntaram-se a dele, em concorde. De nada adiantava uma votação, se poderiam morrer a qualquer minuto. Os velhos voltaram a discutir, primeiro para serem ouvidos em meio a balbúrdia. Depois, começaram a brigar mesmo, quase enérgicos. Era de assustar o modo como aqueles idosos, tão insignificantes, gritavam uns com os outros por um cargo que – em meses, talvez dias – logo perderiam. Porém, na velhice sempre agrega-se um pouco de loucura.

– Como sou o mais velho, devo ser o presidente! – O Vinte exaltou-se.

– Todos nós somos velhos! – Cinco exclamou, o dedo em riste.

– Mas eu sou mais! – e assim continuavam, a concordância transformada em discórdia.

O curador suspirou, cansado. Pigarreando alto, tentou novamente chamar a atenção, mas o pigarro virou uma tosse convulsa. Tirou um lenço de seda do bolso, escarrando. A seda manchou-se de sangue. Resolveu tomar medidas imediatas, ou era ele quem não sobreviveria a esta reunião.

– Senhores, por favor, mais respeito! Se continuarmos assim, não chegaremos a nenhum lugar. Ouçam-me! Somos uma raça especial. Quem, além de nós, já completou mais de dois séculos? Por favor, por favor, menos barulho. Restaram pouco de nós, eu sei, somente dezenove. Mas é exatamente por isso que devemos eleger com calma nosso próximo representante e colocar alguma ordem aqui. – ele tomou fôlego antes de lançar a última frase: – Eu tenho uma solução.

Eles finalmente calaram-se. Como era de se esperar, um ou dois caíram da cadeira, mortos. Ataque do coração, derrame, tanto fazia. Eram tão velhos que pareciam múmias.

– Um sorteio! – o curador disse, seus lábios erguendo-se num sorriso grotesco. – É rápido, não toma muito tempo. Colocamos os nomes em um papel e sorteamos, fácil.

Grande parte do Conselho aceitou esta solução. Aliviado, o curador riscou os nomes na ata da reunião, do Um ao Vinte. Exceto, claro, o Sete e os dois que morreram. Rasgou o papel em pequenos pedaços e colocou-os no jarro sem flores em cima da mesa.

Tampou o objeto com as mãos e o balançou, os olhos dos velhos grudados nele. Ao contrário de antes, só escutava-se as respirações pesadas, pausadas. O Vinte cochilava.

No que foi uma eternidade para eles, o curador retirou um papelzinho qualquer. O desdobrou, solene, e leu o nome aos presentes:

– Vinte!

A maioria amaldiçoou  a escolha. Os mais falsos quiseram cumprimentar o velho.

– Ele ainda está dormindo?

Não, estava morto.

(Elaine Rocha)

A vontade interior de cada ser

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012




Os sorrisos borrados nos lábios
É como antigamente, como antigamente
Ninguém é feliz, ninguém é sincero
A ilusão tornou-se um ópio
Quem experimentou o silêncio?
Quem conseguiu atravessá-lo?
(Quem conseguiria?)
As pessoas se importam com o que não é importante
O amor envolvido na dor
A alegria junto a melancolia
Todos transformaram-se num só
Todos estão sós
As pedras foram colocadas no caminho
Escondem a tristeza, escondem a verdade
Deixam as faces presas – esquecidas
Por suas próprias vontades


(Elaine Rocha)






Design e código feitos por Julie Duarte. A cópia total ou parcial são proibidas, assim como retirar os créditos.
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